Como todas as artes,
a dança é fruto da necessidade de
expressão do homem.
Em nossos dias,
podemos dividir a dança em quatro formas distintas: as religiosas (ou étnicas), as populares
(ou folclóricas), as danças de salão
e as teatrais.
Danças Religiosas: As danças populares
ou folclóricas nasceram, em princípio, de danças religiosas que pouco a pouco
foram sendo liberadas pelos sacerdotes de um culto para que as celebrações (de
casamentos, batizados, de uma boa colheita) passassem a ser realizadas em
praças públicas e não mais dentro dos templos. Essa liberação, cuja data
dificilmente se poderá saber (pois que sobre ela não há registro), significa um
progresso na história da dança. Ao passarem do domínio dos sacerdotes para o
domínio do povo, as manifestações religiosas transformaram-se em manifestações
populares. Assim, com o passar dos anos, a ligação com os deuses foi ficando
cada vez mais longínqua, e danças que nasceram religiosas foram gradualmente se
transformando em folclóricas.
Podemos citar
algumas características da dança como manifestação religiosa: 1) acontecia em
locais especiais, como os templos; 2) era privilégio dos sacerdotes; 3)
realizavam-se dentro de cerimônias específicas, devendo haver razões para a
forma e as datas em que cada dança tinha lugar.
Devemos lembrar que
os deuses eram invocados e seu auxílio solicitado por razões das mais diversas,
fosse pedindo ou agradecendo. Por isso os deuses eram lembrados por ocasião de
nascimentos, casamentos, mortes, guerras e colheitas, ou seja, em todas as
ocasiões em que os homens sentiam necessidade de apoio da divindade de sua
adoração.
As danças pouco a
pouco adquiriram uma coreografia própria, ou seja, passos e gestos específicos
a cada uma, com significado próprio e que deveriam ser respeitados no contexto
de cada uma das cerimônias.
Sabemos, por
exemplo, que os soldados romanos executavam, antes de cada batalha, danças
guerreiras, nas quais pediam o apoio de Marte, deus da guerra, para a luta que
iriam iniciar. Se a princípio a dança era executada por sacerdotes e um número
pequeno de iniciados, aos poucos ela foi abrangendo outros grupos, até ser
dançada por boa parte dos soldados. Com o passar do tempo o seu significado
religioso foi sendo esquecido dando lugar a manifestações de cunho popular ou
folclórico.
As danças guerreiras
de diversas regiões da Ásia e da Europa Oriental se inserem nesse contexto. É
importante notar que, durante vários séculos, a dança era privilégio do sexo
masculino, e só muito mais tarde as mulheres passaram a participar ativamente
das danças.
Sem sairmos do nosso
próprio país, aqui encontramos, entre os nossos indígenas e no candomblé,
suficientes provas da ligação entre a dança e o ato religioso. Encontramos
também outras provas dessa tese em cultos africanos e asiáticos que permanecem
vivos no nosso tempo. Esses exemplos nos mostram que, nos ritos religiosos antes do domínio da Igreja Católica, a danças
integravam quase que totalmente a noção de religião.
No caso das
religiões afrobrasileiras e, especialmente do candomblé, ocorreu um sincretismo
que permitiu que essas religiões sobrevivessem à guerra que lhes foi movida
pela Igreja Católica. Os negros identificaram seus orixás com os santos
católicos e passaram a executar seus ritos em lugares distantes e horas
tardias, procurando evitar a fiscalização da polícia. E tanto conseguiram que
essas religiões e seus derivativos, especialmente a umbanda, a quimbanda e o omolocô,
são seguidos hoje em dia por dezenas de milhões de brasileiros, muitos dos
quais, ao acenderem uma vela para Santa Bárbara de São Jorge, o fazem não só
aos próprios santos mas também a Yansã e a Ogun.
Segundo as
estatísticas, temos hoje uma população indígena de cerca de 10% da que existia
em 1500. Dessa, uma parcela perdeu boa parte de suas raízes e de sua
civilização, mas pelo que restou podemos ter ainda uma noção bastante nítida da
ligação entre dança e religião através das cerimônias de iniciação dos meninos
na vida adulta, dos enterros e casamentos, onde duas presenças são constantes:
a dança e o pagé.
Danças Populares: A nossa dança popular (também
conhecida como dança folclórica) é, ao mesmo tempo, imensamente rica e pouco
executada. Os livros especializados na matéria indicam-nos centenas de danças,
muitas das quais sobrevivem apenas em pequenas cidades e morrem um pouco a cada
ano que passa com a falta de renovação de seus intérpretes e o pouco interesse
das autoridades competentes. Assim, um rico acervo cultural de nosso país vai
se diluindo no tempo e deixará de existir caso não haja uma ação firme por
parte das autoridades culturais.
De acordo com os
especialistas, o folclore brasileiro se divide em dois grupos principais: o urbano, ou aquele que é parte
integrante da vida da população das cidades e que domina principalmente o Norte
e Nordeste do Brasil; e o rural, que
ocupa a maior parte do Sul e Centro-Oeste, mas que se desenvolve principalmente
nas aldeias e vilarejos, fora dos grandes centros urbanos.
As pequenas cidades
sofrem bem menos o impacto da civilização e continuam a procurar o seu lazer
dentro das manifestações folclóricas, tal como faziam os seus antigos
habitantes. Na verdade, essas danças permanecem mais puras quando são interpretadas
nos locais mais distantes dos centros civilizados.
Essa divisão geral
sofre uma subdivisão, de acordo com os meios de subsistência de cada uma dessas
áreas. Assim, as danças locais sofrem, em seu contexto, o impacto do ambiente
em que se desenvolvem. Essa conexão aparece não só na coreografia em si, mas
principalmente nos temas e nos nomes dos personagens. Essas áreas são: 1) Marítima (pesca); 2) Agricultura; 3) Mineração; 4) Pastoreio; e 5)
Região Amazônica.
As festas das áreas
marítimas estão geralmente ligadas aos santos protetores dos marinheiros, que
lhes proporcionam boa pesca ou os protegem dos perigos do mar. Os cantos e
danças dessas festas normalmente contam a história de algum milagre ligado ao
santo que é celebrado. Aqui se percebe a influência clara de danças portuguesas
e espanholas, não apenas nas figuras formadas pelos dançarinos, mas também nos
ritmos, nos instrumentos e nos objetos usados durante as encenações. Essas
danças só são executadas em dias determinados e, na maioria das vezes, nas
praças e jardins, diante das igrejas. Pena que algumas dessas danças estão
desaparecendo rapidamente. Diversas delas sobrevivem em pequenas comunidades e
seus intérpretes pertencem à geração mais velha; talvez a tradição desapareça
com eles. Parece haver um vazio na renovação dos intérpretes – a juventude
mostra-se atualmente mais desinteressada em continuar as tradições.
Felizmente isso não
acontece em todos os lugares. Exatamente o contrário parece estar acontecendo
no Nordeste, onde a renovação dos intérpretes parece acontecer sem problemas.
Na verdade, com o auxílio de especialistas, algumas dessas danças estão
ganhando uma nova força e voltando com renovado impacto ao mundo da nossa
cultura popular (nosso folclore). Em certos estados, como Paraná, Maranhão, Rio
Grande do Sul e Minas Gerais, diversas sociedades foram formadas com o objetivo
de preservar e divulgar a cultura popular (folclore). Mas não há dúvida de que
algumas danças apresentadas em vilarejos distantes correm o risco de desaparecer.Na
lista de nossas danças populares, existem diversos “bailados” de natureza
secular e de origem africana. É possível que, em alguma época, tenham sido
danças religiosas antes de serem transportadas para o Brasil. Dentro dessa
categoria estão a Congada, o Maracatu
(do baque solto e do baque virado), a Dança dos Pássaros, o Reisado, o
Moçambique, os Caboclinhos, o Quilombo, dentre muitas outras. O escritor e
folclorista Mario de Andrade deu-lhes o nome de “Danças Dramáticas”, pois sempre contam uma história com
significado dramático. Além destas, ainda podemos citar inúmeras danças
especificamente nordestinas como: ciranda, frevo, maculelê, tambor de crioula, quadrilha,
forró, samba de roda, cacuriá, côco, puxada de rede e afoxés.
Se diversas dessas
danças, como já dissemos, tiveram sua chance de sobrevivência aumentada com a
fundação de sociedades específicas, muitas delas, como o Maracatu,
transformaram-se em atrações turísticas. Isso significa que sua natureza foi
alterada para fazer face às necessidades de coreografia geralmente imposta pelo
turismo. Seria necessário que essas sociedades atentassem para o problema e
impedissem que sua natureza folclórica fosse se transformando a ponto de chegar
ao que chegou o Carnaval, ou seja, manifestação folclórica cujas origens se
perderam completamente no tempo e no espaço, para se transformar apenas em
atração turística, ou seja, um grande jogo de interesses e grande
empreendimento industrial.
Dança de Salão: Imaginem que a evolução da dança seguiu o seguinte
trajeto: o templo, a aldeia, a igreja, a
praça, o salão e o palco. O salão inclui todas as danças que passaram a
fazer parte da vida da nobreza europeia da Idade Média em diante. Podemos
situar o aparecimento dessas danças na época em que a religião católica
diminuía sua força em proibir tudo aquilo que cheirasse a pecado ou a ligação
com o paganismo. Os especialistas em danças medievais são praticamente unânimes
em dizer que as danças de salão descendem diretamente das danças populares. Ao
serem transferidas do chão de terra das aldeias para o chão de pedra dos
castelos, essas danças foram modificadas. Abandonou-se o que havia nelas de
“menos nobre” transformando-as de acordo com o gosto das classes que se
julgavam superiores.
Tendo se
transformado em diversão das classes mais ricas, a dança foi se sofisticando e
adquirindo movimentos cada vez mais complexos. A descrição das danças daquele
tempo mostra-nos que elas obedecem a uma verdadeira coreografia, a qual, sem
dúvida, foi se formando e enriquecendo através dos séculos. Vale-se ressaltar
que nos séculos XVI e XVII, quando as cortes europeias seguiam rígidas
etiquetas, esses verdadeiros códigos de comportamento diziam até como se
deveria dançar, quem poderia dançar com quem, etc. Foi nessa época que uma manifestação
que nascera livre e espontânea se transformou numa “camisa de força”.
As primeiras danças
sociais, como eram chamadas as danças em casais, surgiram no séc. XIV. Eram a
base dance (1350-1550) e o pavane (1450-1650), dançadas exclusivamente por nobres
e aristocratas. Nos sécs. XIV a XVII a Inglaterra foi berço da contradanse,
também só dançada pela Corte. A popularização das danças sociais deu-se em 1820
através do Minuet e da Quadrille. Já no início do séc. XIX ocorreram rápidas
transformações no estilo de dançar. O minueto e a quadrille desapareceram e a
Valsa começou a ser introduzida nos sofisticados salões de baile. Logo, a polka
e, no início do nosso século, o two-step, one-step, fox-trot e tango, também
invadem os salões. A dança social passa então a ser chamada de Dança de Salão
(Ballroom Dancing).
No Brasil a dança de
salão foi introduzida em 1914, quando a suíça Louise Poças Leitão, fugindo da I
Guerra Mundial, aportou em São Paulo. Ensinando valsa, mazurca e outros ritmos
tradicionais para a sociedade paulista, Madame Poças Leitão não imaginava que
iria criar uma tradição tão forte, seguida por discípulos que continuariam a
divulgar a dança de salão. No Rio de Janeiro a dança de salão cresceu nas mãos
de Maria Antonieta, que, com várias correntes de professores, fazem o nosso
bolero, samba no pé e samba de gafieira famosos no mundo todo.
Danças Teatrais: As danças teatrais, tal como a
conhecemos, iniciou sua trajetória quando Luís XIV fundou, em 1661, a Academia
Nacional de Dança. Essa Academia tem funcionado ininterruptamente até nossos
dias, uma vez que se transformou naquilo que hoje são a Escola e o Ballet da
Ópera de Paris. Assim, através de uma linha ininterrupta de bailarinos e
professores, temos naquele país o desenvolvimento dessa arte desde o século
XVII.
Mas, antes disso,
muitas coisas aconteceram: a semente daquilo que se converteria em Ballet foi
levado à França por Catarina de Médicis,
que queria manter os filhos entretidos enquanto ela se preocupava em governar.
A rainha então importou da Itália artistas e cortesãos especializados na
preparação de luxuosos espetáculos, e lhes encomendou inúmeras diversões que
deveriam manter a corte distraída durante boa parte do tempo. O espetáculo era
uma combinação de dança, canto e textos falados, e seu objetivo era claramente
social e político: um passatempo elegante para o Rei e sua corte. Também
proporcionava ocasiões para o esbanjamento de fortunas e, principalmente,
possibilitava a indecente adulação que a corte fazia ao rei.
O primeiro Ballet a merecer este título
foi o Ballet Comique de la Reine, de Balthasar de Beaujoieux,
italiano, apresentado em 15 de outubro de 1581. Fora encomendado por Catarina
de Médicis por ocasião do casamento de sua irmã. O Ballet Comique de la Reine é
considerado a primeira obra de Ballet porque Beaujoieux, que era músico e
violinista, compôs uma verdadeira coreografia, mostrando extraordinário engenho
nas figuras geométricas que constituíam os diversos quadros e na direção do
espetáculo, dando-lhe um cunho verdadeiramente profissional. Claro está que os
nobres da corte não tinham nenhum treinamento e que os passos executados
estavam dentro das possibilidades dos intérpretes. Mas é o conjunto de fatores
que dá a essa obra o direito de ser apontado como a base da dança teatral, como a conhecemos hoje.
Cem anos depois,
durante o reinado de Luís XIV, a dança ganhou ainda um maior incremento. O
próprio rei adorava dançar e, segundo os cronistas da época, tinha talento para
a coisa. No período entre 1651 e 1669, criou um extraordinário número de
personagens desempenhando os mais variados papéis. E Luís XIV gostava de se cercar da nata de
sua corte e de artistas. Entre seus primeiros bailarinos estava Bassonpierre, que
era Marechal de Campo do seu exército e passou a estimular preguiçosos
cortesãos que chegaram a ser verdadeiros semi-profissionais pois dedicavam todo
o seu tempo à Dança. Molière escrevia as histórias (libretos) e compositores
famosos como Lully e Beauchamps, compunham as músicas para essas extravagâncias
reais.
É interessante notar
que, segundo um historiador importante, o Ballet,
tal como o conhecemos hoje, nasceu quando a acrobacia dos ciganos e
saltimbancos de feira se misturou com a graça artística dos cortesãos.
Luís XIV fundou, em
1661, a Academia de Musica e Dança. Oito anos depois, tendo engordado, o rei
deixou de dançar e a corte imediatamente seguiu o seu exemplo. Mas as raízes da
nova arte estavam devidamente plantadas, e o rei não abandonou o seu apoio à
Academia que fundara e que se encarregava de preparar músicos e bailarinos para
o prazer real. Da mesma forma com que o povo já freqüentava teatros para
assistir as peças de Molière, logo foram sendo apresentados espetáculos que
incluíam a danças como parte integrante de sua estrutura.
BOURCIER, Paul. História da dança no
ocidente. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
FARO, Antônio José. Pequena História da Dança. Rio de Janeiro: Zahar, 1986.
MENDES, Míriam Garcia. A Dança. São Paulo: Ática, 1987.
PORTINARI, Maribel. História da dança. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
WIKIPÉDIA – Enciclopédia
livre