A dança apareceu no mundo desde tempos
imemoráveis – pré-históricos – e é tão velha como a própria vida humana. Nasceu
desde as primeiras manifestações da comunhão espiritual (mística) do homem com
a Natureza, como expressão das emoções primitivas do “homo-sapiens” – era a dança-ritmo.
Para manifestar suas emoções e expandi-las
exteriormente, o homem primitivo recorreu naturalmente ao movimento, ao gesto,
que é a dança em sua forma mais primitiva e elementar.
Antes de usar a palavra, o homem já se
servia do movimento corporal, gesto primitivo, pressionado pelo ritmo natural
de suas emoções.
Por isso, a dança tem os elementos gerais
que se manifestam nas danças de todos os povos, e os elementos específicos que
diferenciam as danças dos diversos povos.
Na vida do homem primitivo a dança antecipava
todos os acontecimentos: nascimento, casamento, mortes, caça, guerras,
iniciação dos adolescentes, doenças, cerimoniais tribais, vitórias, paz,
primavera, sementeira, colheita, festa do sol, da lua, da fertilidade, visando
sempre o mesmo fim: a vida, a saúde, a fertilidade, a plenitude da força.
Este sentido de dança como força mágica,
que antecipava a todos os acontecimentos individuais ou coletivos dos homens
primitivos – pré-históricos – que viveram ou vivem em constante comunhão espiritual
com a Natureza, pouco a pouco foi se acabando...foi se extinguindo no tempo e
no espaço.
Já a partir da idade da pedra, a dança
tornou-se uma obra de arte, começando a adquirir mais importância o elemento
estético (a arrumação dos passos, a beleza). E quando as altas civilizações
fizeram da dança uma simples manifestação estética, quando a dança tornou-se um
objeto de espetáculo, agindo somente sobre os homens e não mais sobre os
espíritos e os deuses, a sua força e potencialidade mágicas desapareceram
definitivamente...
E, ao perder essa força mágica, que
permitia ao homem elevar-se acima da vida e adquirir o poder sobre-humano de
intervir na própria vida da Natureza, a dança perdeu também o seu impulso
criador, transformando-se de dança-mágica em dança arte.
A dança representou um fator de alta
importância no decorrer do desenvolvimento progressivo da humanidade. Pode-se
observar que a oposição entre os movimentos “amplos” e os “estreitos”, marca,
inclusive, o contraste da própria natureza dos sexos.
Nas danças antigas o homem aparece com mais
aptidão (facilidade) para os movimentos amplos - saltos, passos grandes, etc. –
enquanto a mulher, em geral, surge com inclinação para os movimentos estreitos
– curtos, pequenos, em contato contínuo com o solo, opondo à audácia e ao
dinamismo másculos, a prudência, a calma, a graça harmoniosa. Nestas danças,
enquanto o homem saltava corajosamente no ar, a mulher apenas deslizava em
pequenos passos pelo chão e tentava se elevar sobre os pés.
Quanto mais um povo está ligado ao regime
matriarcal (importância maior da mulher) e ao cultivo da terra, mais a sua
dança é calma, pausada, composta de movimentos estreitos. Pelo contrário,
quanto mais um povo pertence ao regime patriarcal (importância maior do homem)
e a sua vida nômade (caçando e mudando de local, sem se fixar no solo) mais a
sua dança é composta movimentos amplos em geral.
Daí abre-se a interessante perspectiva de
relações entre o caráter dos movimentos de dança e o desenvolvimento social e
cultural dos povos.
O primeiro tipo de expressão coreográfica
que se tem notícia é representado pela dança que segue estritamente a própria
Natureza. Por meio de gestos ensaiados (pantomima), a dança antecipava o
acontecimento desejado, influenciando, deste modo, a realização do que eles
desejavam. Assim, por exemplo, a dança da caça previa o feliz acontecimento de
conseguir caçar o animal desejado; a dança imitando os animais auxiliava a
domá-los. Este tipo de expressão coreográfica pode-se denominar de dança
figurativa ou imitativa.
Outro tipo, que se opunha à dança imitativa
era a dança abstrata que procurava atingir o objetivo sem imitar os atos, os gestos, ou as formas. Essa dança
visava o êxtase por meio do encantamento místico, e era praticada em círculo,
para que as forças magnéticas das pessoas que formavam o círculo penetrassem no
dançarino, ou vice-versa.
Desde o início da vida humana, são três as
formas fundamentais de dança: - em “solo”, em “pares” e em “grupos”.
A dança “solo” ou “individual”, tornou-se
com o tempo, privilégio do chefe da tribo, que com sua mágica assegurava a
marcha feliz da vida da comunidade.
Muitas vezes a dança solo era acompanhada
pela dança em grupo, como uma reação orgânica emocional, que procurava
exprimir-se numa manifestação dançante coletiva.
A forma mais característica da dança em
grupo é o círculo, que, à medida da elevação do nível cultural, estabelecia
entre seus componentes os movimentos e andamentos idênticos a todos.
A dança em pares era a forma mais
importante da dança. Sua motivação principal era a união dos dançarinos para
simbolizar a fertilidade, o crescimento da própria tribo.
As danças masculinas eram muito mais
numerosas que as femininas. As danças de caça, guerreiras, solares, imitativas,
animalizadas, de máscaras, dos espíritos, etc., eram privilégio dos homens.
Todas as danças de fertilidade, de chuva, de plantação, de colheita, de
nascimento, de iniciação à puberdade, lunares, fúnebres, etc., eram próprias
das mulheres.
Os primeiros documentos sobre a origem
pré-histórica dos passos de dança são provenientes de descobertas das pinturas
e esculturas rupestres nas cavernas do homem da era paleolítica, mesolítica e
neolítica, que deixaram gravadas a sua obra de arte nas pedras lascadas e
polidas das cavernas.
A dança, como toda atividade humana, sofreu
o destino das formas e das instituições da existência social dos homens. E
assim, a dança de poder místico, que agia sobre os homens, espíritos e deuses,
transformou-se numa dança de propriedade humana, contagiando os homens pela sua
ação puramente estética e artística. A dança-religião aos poucos foi se
acabando, cedendo lugar à dança-arte.
As culturas tribais evoluídas, que
estabeleceram a ligação imediata com as grandes civilizações apresentavam,
também dois tipos coreográficos: dança camponesa (popular, campesina ou de
folclore), e a dança aristocrática (senhorial) para a distração dos reis, príncipes e personagens da linha
senhorial.
Essa reviravolta no domínio da dança deu
origem à dança-arte das grandes civilizações; ao mesmo tempo em que a dança da
cultura camponesa deixou sua herança de coreografias para o folclore dos povos
de hoje (danças populares).
Texto baseado em: FAHLBUSCH. Hannelore.
Dança: moderna e contemporânea. Sprint. Rio de Janeiro 1990.